COP29: Aumentam denúncias de exploração de gás fóssil no Sul Global para exportação ao Norte

Representantes da América Latina, Ásia e África apresentam dados sobre terminais e exploração de GNL, em painel que contou com o IEMA

A lógica colonialista segue imperando no mundo da exploração do gás fóssil. Hoje (20), o Asia Climate Solutions, pavilhão dentro da 29ª Conferência das Partes (COP 29) da Convenção-Quadro das Nações Unidas para Mudanças Climáticas, em Baku, Azerbaijão, promoveu o encontro de pesquisadores e representantes da sociedade civil com foco em três continentes: América Latina, Ásia e África. Os especialistas apresentaram o aumento, em suas regiões, da construção ou da intenção de se investir em exploração e terminais de recebimento e de distribuição de GNL (gás natural liquefeito). As palestras mostraram que a maior parte do GNL segue para exportação aos países desenvolvidos do Norte Global.

O debate ocorreu em torno da exploração e da exportação do gás fóssil. As apresentação das organizações Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), Say No to LNG, Climate Analytics, Don’t Gas Africa e Center for Energy, Ecology and Development (CEED) convergiram para um problema: países desenvolvidos internacionalizam sua demanda por GNL e, por tabela, seus impactos socioambientais. “Nigéria e Moçambique são dois dos maiores produtores de GNL da África, mas o gás não é empregado internamente, é exportado para o Norte Global. E a ideia dos importadores é fazer o mesmo com a Tanzânia”, alerta Omar Elmawi, do Africa Climate Movement Building Space. 

Elissama Menezes, diretora do Say No to LNG, abriu o encontro “Da terra ao transporte marítimo: esforços transcontinentais para a transição do GNL” (From land to shipping: cross-continental efforts to transition beyond LNG), ressaltando que há um imenso impacto no processo de liquefação do gas. “São empregados produtos químicos, muita água e consumo de energia”, diz a especialista. Depois, transportar o combustível em navios de carga que o levarão para outros continentes pode gerar um rastro de destruição ao atormentar a vida marinha, espalhar espécies invasoras e emitir emissões devido ao percurso do próprio navio, sem contar os riscos de vazamento e de impactos locais.

No sudeste da Ásia, há também a preocupação com impacto aos corais, visto que o local é um hot spot marinho – uma região com altíssima biodiversidade e que enfrenta graves ameaças devido à atividade humana. O chamado “Triângulo de Corals” – abrangendo a Indonésia, Malásia, Papua Nova Guiné, Filipinas, Timor-Leste e Ilhas Salomão – tem uma biodiversidade marinha excepcionalmente alta, abrigando 76% das 798 espécies conhecidas de corais. Embora ocupe apenas cerca de 1,6% dos oceanos, o Triângulo cobre a maior extensão única de recifes de coral do mundo, com quase 73.000 quilômetros quadrados, ou 29% da área global. Literalmente acima deles, os navios carregados de GNL estão passando. Filipinas, por exemplo, já tem 15 terminais de GNL, ou seja, portos para abastecer ou retirar o combustível. Se nada for feito, a tendência é de aumento do transporte marítimo no local.

América Latina

Na América Latina, três países são os grandes hotspots para GNL: Brasil, Argentina e México. Vaca Muerta, na Argentina, tem a segunda maior reserva de GNL do mundo e a quarta em shale oil. A região vive sob pressão de exploração. No México, estão sendo construídos quatro terminais de GNL para atender ao mercado americano. No Brasil, a maior preocupação se dá com relação ao petróleo. Isso porque, em sua grande maioria, o gás explorado é associado a ele. É o caso da Margem Equatorial, que além das emissões decorrentes, causa preocupação pelo mesmo motivo que o Triângulo dos Corais. Ela está inserida na Foz do Amazonas, um local social e ambientalmente super sensível.

“O governo brasileiro tenta convencer que o phase out de petróleo  não deve acontecer e a manutenção de sua produção é essencial para a economia e ganhos sociais do país”, afirma Ricardo Baitelo, gerente de projetos do IEMA. “Segundo a NDC do Brasil, somos referência global em ações de redução do desmatamento, o que não significa que podemos continuar explorando gás e petróleo”, completa. Vale ressaltar que a parte desses combustíveis retirados no Brasil, como ocorre na Ásia e na África, são exportados para mercados internacionais .

Bill Hare, pesquisador do Climate Analytics, alertou que, até 2030, a capacidade de transporte de GNL pode chegar a 174 milhões de m³, 55% a mais do que em 2023. Para gerar energia internamente, os países do Sul Global não precisam explorar combustíveis fósseis. Eles têm uma alta incidência solar e ventos favoráveis para a instalação de usinas eólicas. Segundo o CEED, como exemplo, as Filipinas, a Indonésia e o Vietnã são os países da região que mais investem em energia renovável. Nas Filipinas, a organização está em campanha para inserir 10 milhões de painéis solares em telhados. Os países do Sul Global precisam explorar as sinergias de recursos naturais e modelos de negócios sustentáveis. Bons exemplos não faltam.