Estabelecida no Brasil com a Rio 92, a Conferência das Partes (COP) sobre mudanças climáticas da Organização das Nações Unidas (ONU) retornou ao país para realizar sua trigésima edição em Belém, no Pará. Ainda que o texto final da COP30 tenha incluído povos indígenas e quilombolas, impulsionado pela participação de representantes dos mesmos na conferência pela primeira vez na Amazônia, não houve decisão consensual dos 195 países participantes sobre um mapa do caminho para a transição dos combustíveis fósseis. Viu-se mais um capítulo desse filme que completa três décadas em que, apesar dos cada vez mais alarmantes alertas dos cientistas, as resoluções entre os países se constroem sob tensões, impasses e disputas, com avanços graduais, mas insuficientes.

As principais ações para a mitigação de gases de efeito estufa ficaram fora do texto final. O já citado “mapa do caminho” para o fim dos combustíveis fósseis, pleiteado pela sociedade civil mobilizada nas ruas e na conferência, será uma iniciativa continuada da presidência da COP30 até o fim do seu mandato antes da próxima conferência ao final de 2026.
Ainda que não tenha conseguido atingir o consenso e entrar no texto final do Mutirão – esforço conjunto para ações de redução de emissões de gases de efeito estufa – o tema deve passar por discussões técnicas ao longo de 2026 e permitir que cada país determine seu roteiro de transição. A iniciativa conta com o apoio de mais de 80 países que se posicionaram pela transição dos combustíveis fósseis durante a COP30, e ganha tração com a inédita primeira conferência para o phase out de combustíveis fósseis a ser realizada na Colômbia em abril, fora do sistema ONU.
Vale ressaltar que o presidente da conferência, André Corrêa do Lago, exercerá a função de presidência da COP até a véspera da próxima edição, e assumiu o compromisso de estruturar o “mapa do caminho”. É importante acompanhar como ela será conduzida no âmbito doméstico, com as contradições do governo brasileiro em defender o aumento da produção de combustíveis fósseis e com todos os desafios técnico-econômicos e socioambientais da transição energética.
Com relação a medidas presentes nos textos finais, destaca-se a criação do “Belem Action Mechanism”, um hub destinado a apoiar a transição justa para os trabalhadores da indústria fóssil, por meio de assistência internacional de cooperação técnica e apoio a políticas públicas, e o aumento dos fundos destinados à adaptação de países vulneráveis de 100 para 300 bilhões de dólares até 2035.
A mobilização da sociedade civil brasileira ao longo do ano contribuiu para seu inédito reconhecimento nos textos oficiais de populações tradicionalmente vulnerabilizadas pela crise climática. Afrodescendentes foram mencionados em documentos sobre gênero, adaptação, transição justa e no texto do Mutirão; povos indígenas conquistaram a inclusão inédita de seus direitos territoriais e conhecimentos tradicionais em documentos sobre mitigação, adaptação e transição justa.
A COP em Belém se destacou além das negociações dentro das salas da ONU e das exposições das Zonas Azul e Verde. A cidade se transformou em um enorme ecossistema de debates, manifestações e ocupações simbólicas do espaço público e também privados. São exemplos as casas temáticas espalhadas pela capital como a Casa Dourada e o Amazon Climate Hub, promovido pelo Instituto Arayara, além de seminários como “Metano: Freio de Emergência Climática”, realizado no Museu das Amazônias.



O Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA) esteve presente em todos esses espaços citados: contou com 24 palestras, distribuídas entre Blue Zone, Green Zone, espaços parceiros e atividades abertas na cidade. O instituto contribuiu para debates sobre transição energética, política energética brasileira, transparência de dados de emissões, metano, minerais críticos, bioenergia e infraestrutura na Amazônia — temas estratégicos para o Brasil e para a governança climática global.
Outro fato marcante foram as mobilizações populares. A Barqueata da Cúpula dos Povos, que contou com a participação do GT Infraestrutura Socioambiental, rede da qual o IEMA faz parte, levou mais de 200 embarcações à Baía do Guajará, reunindo cerca de cinco mil pessoas de 60 países em um ato pela Amazônia. A Marcha da Saúde e Clima destacou a relação direta entre aquecimento global e saúde pública. Já o iluminado Porongaço dos Povos da Floresta, promovido pelo Conselho Nacional das Populações Extrativistas, levou extrativistas às ruas com suas lanternas tradicionais, reivindicando justiça climática e demarcação de terras.
Por sua vez, a Marcha Global pelo Clima, com 70 mil pessoas ocupando 4,5 km das ruas de Belém, ganhou repercussão internacional: desde 2019, na COP25 realizada em Madri (Espanha), não se via um ato dessa magnitude em uma conferência climática. Fantasias, boitatás, máscaras de animais, carimbó e brega transformaram reivindicações como fim dos fósseis, taxação dos super-ricos, proteção dos rios e demarcação de territórios em um grande e colorido desfile da diversidade.






Os resultados da COP30, somados às necessidades de desenvolvimento socioeconômico e às contraditórias decisões domésticas sobre o setor de energia, reforçam a necessidade da construção de um mapa do caminho brasileiro que possa se alinhar preventivamente a diferentes cenários de conjuntura internacional. É necessário construir mais conhecimento e aprimorar as políticas públicas dentro do país para que ele caminha em uma rota concretizável de expansão e transição energética e, conforme o jargão defendido ao longo da preparação para a COP30, o país possa liderar pelo exemplo no novo caminho aberto para a realização do phase out dos combustíveis fósseis no mundo.