O transporte de cargas no Brasil emitiu em 2016 quatro vezes mais gases de efeito estufa do que a Noruega emite anualmente. Apenas os caminhões lançaram no ar 84,5 milhões de toneladas de CO2 equivalente[1], mais do que todas as termelétricas fósseis em operação no país (54,2 milhões de toneladas).
Os dados são de uma nova análise das emissões do setor de energia do SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa), publicada nesta quarta-feira (13) pelo Observatório do Clima. O relatório mostra que a frota de caminhões foi o principal emissor de poluentes climáticos do setor de energia no Brasil naquele ano, o mais recente para o qual há dados disponíveis. E indica como será difícil descarbonizar esse segmento da economia, em especial após a greve dos caminhoneiros, que resultou num aumento do subsídio ao óleo diesel.
Em 2016, o setor de energia emitiu 423,5 milhões de toneladas de CO2 equivalente, ou 19% do total nacional. São as emissões causadas pela queima de combustíveis fósseis, em especial petróleo e derivados – que respondem por 70% do total emitido. Diferentemente de outros países, nos quais o carvão para geração de eletricidade é a fonte mais importante de poluição climática, no Brasil o principal usuário de combustíveis fósseis é o transporte, em especial o rodoviário: são 204 milhões de toneladas emitidas nesse segmento, divididas igualmente entre carga e passageiros (102 milhões de toneladas cada).
A necessidade de descarbonizar a matriz de transportes esbarra na grande dependência que o país tem do modal rodoviário como opção para transportar cargas. Dos seis países com maior extensão territorial do mundo, o Brasil é o que mais usa caminhões (65% da carga transportada, contra 53% na Austrália, o segundo colocado, e apenas 8% na Rússia). Segundo o Iema (Instituto de Energia e Meio Ambiente), responsável pelas estimativas de emissões do setor de energia no SEEG, esse predomínio deve se manter pelo futuro previsível do planejamento governamental.
É possível reduzir as emissões no setor através da transferência de parte do transporte regional de cargas para modos menos intensivos em carbono, como o ferroviário e o aquaviário. Aumentar a eficiência energética dos caminhões ou encontrar fontes de energia alternativas que possam movê-los são outras estratégias. Mas todas têm limitações.
“A greve dos caminhoneiros escancarou a enorme dependência que o Brasil tem do óleo diesel”, diz André Ferreira, diretor-presidente do Iema e coautor do relatório, juntamente com David Tsai, Marcelo Cremer, Munir Soares e Felipe Barcellos e Silva. “É preciso pensar em soluções como a eletrificação da logística, que reduzam essa dependência, mas sem aumentar os custos do transporte de cargas.”
ECOS DA CRISE
O relatório analítico do SEEG também mostra que as emissões do setor de energia sofreram uma redução de 7,3% em 2016 em relação ao ano anterior. Isso se deveu à recessão, que impactou a indústria e o transporte de cargas, à recuperação parcial dos reservatórios das hidrelétricas – que permitiu desligar termelétricas fósseis que vinham sendo acionadas para fazer frente à estiagem –, ao aumento do uso de etanol no transporte de passageiros e à expansão das usinas eólicas.
O documento engloba, além do setor de energia, o de processos industriais e uso de produtos. Ele integra a série de cinco documentos de análise que todo ano são publicados alguns meses após o lançamento dos dados do SEEG. Nas próximas semanas serão lançados o relatório analítico do setor de agropecuária e um documento-síntese com recomendações para a governança climática do Brasil.
[1] CO2 equivalente é a soma de todos os gases de efeito estufa convertidos no potencial de aquecimento do CO2, o principal deles.