Crise do coronavírus e o futuro da mobilidade em São Paulo

Ônibus podem ser protagonistas de uma mobilidade mais democrática e menos poluente

*Este artigo foi publicado originalmente no Le Monde Diplomatique Brasil, em setembro de 2020. Leia na íntegra aqui.

São Paulo, colosso urbano com mais de doze milhões de habitantes, é a mais populosa cidade do hemisfério ocidental. Seus desafios urbanos são igualmente grandiosos. A pesquisa “Viver em São Paulo: Qualidade de Vida (2020)”, da Rede Nossa São Paulo, levantou as principais queixas dos paulistanos, obtendo “trânsito” como um dos itens mais citados, atrás apenas de “violência e criminalidade”. Ainda foram mencionados como problemas a “poluição” e o “tempo de locomoção”.

Congestionamentos, poluição do ar, mortes e morbidades decorrentes do trânsito, além do comprometimento do restrito orçamento das famílias com elevadas despesas de deslocamento, são disfunções decorrentes de um projeto de desenvolvimento urbano rodoviarista e centrado no uso do automóvel particular. Modelo esse historicamente seguido pela maioria dos tomadores de decisão da capital paulista. Há 90 anos, Francisco Prestes Maia, engenheiro-arquiteto que viria a ser prefeito de São Paulo em duas ocasiões futuras, apresentou seu Plano de Avenidas, conhecido documento definidor do funcionamento não só dessa cidade, como do urbanismo brasileiro. O desenho viário de Prestes Maia priorizava o transporte individual e vemos seus estruturais e duradouros resultados no cotidiano atual.

Na capital paulista, os automóveis são os grandes responsáveis pela excessiva ocupação do espaço viário. Eles respondem por 88% de toda quilometragem percorrida no transporte rodoviário de passageiros quando considerado apenas veículos motorizados – o que também inclui motocicletas (9%) e ônibus (3%). Valendo-se desse mesmo recorte, segundo a Pesquisa Origem e Destino (OD) 2017 do Metrô, somente 36% dos trajetos diários de pessoas que acontecem no território paulistano são feitas por meio de carro. Ou seja, uma parcela privilegiada da população toma a maior parte do espaço público e dificulta a circulação dos ônibus. Para os passageiros de ônibus, a péssima sensação de confinamento no trânsito é intensificada pela superlotação nos veículos. (…)