O Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA) está presente na Conferência das Partes (COP29), reunião das Nações Unidas sobre as mudanças climáticas (UNFCCC, em inglês), em Baku (Azerbaijão), para participar de oito eventos e acompanhar discussões de energia transporte de cargas, emissões e impactos socioambientais. Na primeira semana, os destaques foram a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) brasileira – esforço de cada país para reduzir as emissões nacionais –, o aumento da importância do metano para a sociedade civil e a falta de alguns temas mais “domésticos” como transportes de cargas em conversas promovidas por diversos atores presentes no evento da ONU.
O Brasil anunciou sua nova Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) para 2035, prevendo uma faixa de emissões entre 850 milhões e 1,05 bilhão de toneladas equivalentes de CO2. Anteriormente, o Observatório do Clima (OC) havia lançado sua proposta de NDC ao governo, que contou com a participação do IEMA, projetando emissões de 642 milhões de toneladas para 2035, ou um valor 63% superior à maior proposta nacional. “O Observatório do Clima mostrou o caminho das pedras que o Brasil precisa trilhar para ter uma NDC muito mais ambiciosa do que a apresentada. Além disso, seria salutar que o compromisso do governo brasileiro apresentasse metas setoriais, deixando clara a contribuição de cada um deles. O país não pode depender apenas do setor de mudança de uso da terra. A contribuição brasileira pode ser ainda maior se todos os setores potencializarem suas ações de mitigação”, Felipe Barcellos e Silva, pesquisador do IEMA.
Nos sides events (eventos oficiais da ONU), alguns temas em destaques em outras edições tiveram menos realce, como a poluição do ar e transporte de cargas. Por outro lado, tem crescido o interesse em tópicos como metano e recursos financeiros para ações de mitigação em países do Sul Global.
A atual COP29 tem como prioridade acordar e quantificar um valor de financiamento para ser pago por países desenvolvidos para que países em desenvolvimento mitiguem emissões e se adaptem às mudanças climáticas. Essa discussão enfrenta impasse entre delegações e não se pode afirmar se haverá consenso até o final da conferência em relação aos valores necessários e às condições dessa transferência.
O tema de financiamento debatido pelos negociadores motivou discussões semelhantes nos pavilhões e estandes. Se, por um lado, existe essa facilidade em encontrar debates nos pavilhões dos países e das organizações com especialistas em economia, as populações tradicionais, umas das mais afetadas em países em desenvolvimento, parecem estar em menor quantidade pelos corredores do evento em relação a edições anteriores da conferência.
Emissões
Há cinco anos, na COP25 de Madri, a qualidade do ar recebeu uma atenção especial. O local do encontro contava até com uma instalação para alertar sobre a poluição do ar. Hoje em dia, a estrela da vez é o metano. A discussão envolve governos e sociedade como um atalho para a redução de emissões. Vale lembrar que o Brasil é o quinto país mais emissor de metano, atrás apenas da China, dos Estados Unidos, da Índia e da Rússia. No país, a maior parte desse gás é proveniente da agropecuária.
Felipe Barcellos e Silva (IEMA) e Gabriel Quintana (Imaflora), ambos pesquisadores do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG) coordenado pelo Observatório do Clima, apresentaram as emissões de metano no Brasil em debate realizado no Regional Climate Foundations. No encontro, destacaram que é possível reduzir as emissões do poluente climático. Se nada for feito, em 2030 a emissão de metano pode chegar a 23 milhões de toneladas. Se forem aplicadas as indicações do cenário elaborado pelo SEEG em 2022, esse montante pode cair para cerca de 14 Mt CH4, uma redução de cerca de 40%.
Energia
Na apresentação realizada no side event (evento oficial da ONU) “Alavancando as NDCs para a Transição Gradual dos Combustíveis Fósseis e Proteção da Biodiversidade”, o IEMA levou a complexa posição do Brasil em relação à exploração de petróleo e gás, especialmente na região da Foz do Amazonas. O painelista Ricardo Baitelo, gerente de projetos do IEMA, destacou que as pretensões do país em expandir a exploração de gás e de petróleo devem prejudicar as metas globais de redução de emissões de gases de efeito estufa.
“Ainda que o Brasil tenha progredido em termos de redução de emissões no último ano, tanto por esforços para a redução do desmatamento quanto pela aceleração da instalação de energias renováveis, o objetivo do governo de aumentar a produção de óleo e de gás no médio prazo – uma ação climática contraproducente – não é computada na NDC. As emissões provenientes da queima de produtos exportados são contabilizadas nas NDCs dos países compradores. Seria essencial discutir critérios para que esses elementos sejam capturados de forma devida nos compromissos dos países exportadores de combustíveis fósseis”, afirma Baitelo.
Socioambiental
Diferente da última COP, as populações tradicionais – inclusive a delegação indígena brasileira – parecem estar com menor participação física, embora a discussão central seja sobre financiamento para mitigação e adaptação aos países do Sul Global. De qualquer maneira, elas seguem reforçando que sua relação com a terra deve ser considerada para escolherem se querem ou não algumas ações em seus territórios, como créditos de carbono. Há uma tentativa de barrar a lógica capitalista embutida nas “soluções” para as mudanças climáticas.
Aliás, ex-presidentes, organizações internacionais, fundações, entre outros escreveram uma carta questionando a estrutura atual da conferência e pedindo mudanças na negociação para a implementação de acordos, garantindo a transição energética urgente e a eliminação gradual da energia fóssil. Uma conversa sobre a organização da Cúpula dos Povos de Belém, a ser realizada em paralelo à COP do próximo ano, está alinhada com o pedido.
Ativistas e organizações do terceiro setor estão se unindo para fazer um evento na Universidade Federal do Pará (UFPA), paralelo à COP30. A ideia também é questionar o sistema sobre como as decisões são tomadas para enfrentar com mais consistência as mudanças climáticas e trazendo justiça socioambiental.
Populações provenientes de locais com menos recursos financeiros como a África, o Caribe as Ilhas dos Pacífico (Moana) se uniram para pedir soluções em conjunto – e mesmo dividir pavilhões.
Transporte de cargas
No Brasil, o transporte rodoviário de cargas é a principal atividade emissora de gases de efeito estufa pela queima de combustíveis fósseis. Apesar do abate de emissões associadas nesta atividade ser um desafio na maior parte dos países, durante a COP, as discussões sobre transporte de cargas têm sido focadas na navegação. Um ponto abordado a este respeito foi o emprego de combustíveis menos emissores em navios, a taxação da emissão de transporte marítimo global de carga e enviar esse possível recurso decorrente dessa taxação a ações ou locais com mais necessidades. No entanto, faltou esclarecer como essa possível taxa será coletada, manejada e distribuída. Parece que a ideia é criar um comitê para os países em desenvolvimento que ficará responsável por essas questões.
Também não se identificou discussões sobre impactos locais das infraestruturas de cargas – há muitos países sensíveis ao problema como latinos, africanos e asiáticos. Algumas infraestruturas, como ferrovias e hidrovias, são vistas como soluções de baixo carbono, mas sentiu-se a falta de debate sobre os cuidados necessários para que suas implementações não causem mais impactos negativos do que benefícios ambientais. No Brasil, esse assunto tem sido motivo de conflitos e discussões crescentes pelo fato de os governos anteriores terem priorizado projetos de transporte de commodities agrícolas e minerais por meio de corredores logísticos que cortam a Amazônia.